Introdução - Segurança contra Incêndio em Estabelecimentos Assistenciais de Saúde
Introdução
Conforme dados divulgados pela Secretaria Nacional de
Segurança Pública do Ministério da Justiça1,
verifica-se que ocorrem anualmente no Brasil mais de 267.000 incêndios. São
mais de 700 ocorrências por dia em todo o território nacional, custando a vida
de cerca de 1.000 pessoas por ano2,
registrando um dos maiores índices de fatalidades por causas relacionadas a
incêndios verificados em todo o mundo3.
Por outro lado, de um total de 506.400 incêndios
estruturais contabilizados a cada ano nos Estados Unidos da América (EUA), o
montante de 6.240 incêndios ou 1,2% desse total são registrados em
Estabelecimentos Assistenciais de Saúde (EAS). As ocorrências de incêndio em
EAS nos Estados Unidos são responsáveis por 1,1% do número total de civis
feridos (14.960), por 0,2% do número total de óbitos (2.810) e ainda por 0,5%
do total de prejuízos (US$ 10,6 bilhões) registrados anualmente em incêndios
estruturais (Ahrens, 2012).
Portanto, considerando os dados disponíveis no Brasil e
estabelecendo-se um paralelo simplista com as estatísticas norte-americanas no
tocante ao percentual de ocorrências em EAS, ou seja, 1,2% do total de
ocorrências, pode-se considerar que os incêndios em Estabelecimentos
Assistenciais de Saúde no Brasil podem representar 3.200 ocorrências ao ano, ou
cerca de 270 incêndios ao mês.
Ainda sobre os dados oficiais da SENASP citados
anteriormente, acredita-se que deva ser considerado um número relevante de
subnotificações, ou “princípios” de incêndio que não foram formalmente
comunicados às autoridades responsáveis e, assim, não foram contabilizados nos
dados apresentados, quer por terem sido debelados por brigadistas ou por terem
se autoextinguido sem maiores consequências civis ou patrimoniais.
Verifica-se,
assim, que incêndios acontecem com grande frequência em Estabelecimentos
Assistenciais de Saúde, independentemente das proporções, as causas, das
consequências, ou por terem maior ou menor repercussão na mídia. Fato!
Os Estabelecimentos Assistenciais de Saúde estão em
constante transformação em função de novos conhecimentos médicos e do
desenvolvimento de novas tecnologias que acabam por modificar constantemente o
desenvolvimento dos projetos e o ambiente construído.
A complexidade dos projetos dos EAS, em especial das
edificações hospitalares, pode ser mais bem compreendida sob o enfoque do
programa de necessidades combinado com parâmetros funcionais rigorosos,
múltiplas redes de instalações prediais e a necessidade de flexibilidade
construtiva para que possam incorporar essas novas tecnologias.
Portanto, além de se ter uma edificação em constante
transformação espacial, ou seja, uma edificação constantemente “em obras”,
tem-se que grande parte dos Estabelecimentos Assistenciais de Saúde comporta
ainda equipamentos eletromédicos4
sofisticados que exigem instalações extremamente complexas, além de requerer
também serviços específicos de hotelaria.
Esses fatores combinados, por si só, evidenciam um elevado
risco de incêndio em edificações dessa natureza, que pode sim ser reduzido, se
forem implementadas medidas de controle adequadas.
Cabe ressaltar que ao mesmo tempo em que as constantes
intervenções fragilizam o sistema de segurança contra incêndio das edificações,
quer seja pela elevação (momentânea) do risco em si, quer seja pelas “soluções
técnicas provisórias” costumeiramente empregadas, representam também,
constantes oportunidades para implementar ou ainda ampliar a segurança contra
incêndio dos EAS.
Assim,
cada nova intervenção arquitetônica deve ser aproveitada para aprimorar o
sistema de segurança contra incêndio existente, num processo de melhoria
contínua.
Como marco inicial do processo de implementação de um
sistema de segurança contra incêndio, deve-se definir claramente quais são os
objetivos do Estabelecimento Assistencial de Saúde e quais são suas
necessidades operacionais básicas. Com esse entendimento, a equipe
multidisciplinar envolvida no projeto ou ainda na operação desse EAS deve
projetar ou atuar de forma consciente e assertiva na definição do risco de
incêndio tolerável tanto de forma geral, quanto de forma específica para a
edificação em questão. Os níveis aceitáveis de risco, assim como o foco da
análise de risco de incêndio para definição das medidas de segurança necessárias,
devem estar baseados no seguinte tripé (Coté et al, 2002):
1) Segurança à vida.
2) Proteção do patrimônio.
3) Continuidade dos negócios (operação do EAS).
Para tanto, inicialmente é necessário que os profissionais
envolvidos no desenvolvimento dos projetos e na operação dessas edificações
conheçam os parâmetros, os requisitos mínimos de segurança contra incêndio e as
alternativas de solução disponíveis para que possam incorporá-las adequadamente
desde a concepção inicial dos projetos, provendo soluções de arquitetura e de
engenharia integradas, econômicas e eficazes.
Preponderantemente em estabelecimentos dessa natureza, há
de se considerar que os problemas de saúde em si, bem como os problemas de
mobilidade, podem dificultar drasticamente que grande parte dos pacientes
consiga, sem auxílio, abandonar a edificação em caso de incêndio e, portanto,
deve-se trabalhar incansavelmente na prevenção desse risco, no treinamento dos
colaboradores e em equipar essas edificações com meios eficazes de resposta
(ex.: medidas de proteção ativas) para a eventualidade da ocorrência de um
incêndio (Ahrens, 2003).
Assim, todo sistema de segurança contra incêndio para
Estabelecimentos Assistenciais de Saúde deve ser desenvolvido, adotando-se como
condicionante fundamental que um significativo número de ocupantes pode estar
confinado a macas ou camas, outros necessitam de cadeiras de rodas, enquanto
poucos são capazes de se movimentar sozinhos, embora possam ter grandes
dificuldades para tal.
Como visto nas diversas infraestruturas, sistemas e
instalações de habitabilidade, os Estabelecimentos Assistenciais de Saúde
apresentam desafios distintos no que tange à segurança contra incêndio e mais
complexos que os percebidos nas demais ocupações.
Portanto,
em razão das especificidades e do conhecimento técnico sobre os EAS, cabe aos
profissionais do Sistema Nacional de Vigilância Sanitária – SNVS a verificação
das medidas de segurança contra incêndio adotadas para os novos projetos e a
validação do funcionamento dessas medidas na operação dos EAS, não delegando a
análise exclusivamente aos Corpos de Bombeiros locais.
Esse “Manual de Segurança Contra Incêndio em Serviços de
Saúde” pretende transmitir os conceitos fundamentais sobre fogo, incêndio e
suas consequências, bem como soluções técnicas para minimizar o risco e as
consequências de um eventual incêndio, auxiliando na definição formal
dos parâmetros e requisitos mínimos de segurança contra incêndio em serviços de
saúde.
Segundo a proposta mais recente da OMS, segurança ao
paciente significa “ausência de dano desnecessário, real ou potencial,
associado à atenção à saúde”, portanto, os sistemas de saúde que diminuem a um
mínimo possível os riscos de dano ao paciente (provendo segurança) estão
irremediavelmente aumentando a qualidade dos seus serviços. Assim, Segurança é uma das dimensões da Qualidade nos serviços de saúde
(ANVISA, 2013).
A ocorrência de um incêndio em uma edificação destinada à
atenção à saúde coloca em risco a saúde de todos os seus ocupantes. Em
especial, coloca em severo risco a saúde dos pacientes que encontram-se
fragilizados. Portanto, implementar segurança contra incêndio nos EAS promove a
Segurança do Paciente e a Qualidade nos Serviços de Saúde, sendo parte dos
esforços necessários para acreditação dos Estabelecimentos Assistenciais de
Saúde. Implantar medidas de segurança contra incêndio ou ainda ampliá-las,
encontra-se igualmente alinhado com os preparativos necessários para o
atendimento de eventos com grandes concentrações de pessoas (eventos de massa).
Importante também destacar que a definição de um sistema
de segurança contra incêndio eficiente na atualidade deve ainda considerar a
possibilidade de um incêndio doloso (ou criminoso) e que o fogo pode vir a ser
utilizado como “arma” em um ato antissocial ou ainda em um ataque terrorista,
por extremistas.
Embora o foco principal das medidas de segurança contra
incêndio5 seja a segurança à vida e
não a proteção da propriedade, ao seguir as recomendações estabelecidas nesse
“Manual de Segurança Contra Incêndio em Serviços de Saúde”, são indiretamente
alcançados benefícios relevantes na proteção do patrimônio, na continuidade das
atividades essenciais dos Estabelecimentos Assistenciais de Saúde e também na
proteção do meio ambiente.
Esse “Manual de Segurança Contra Incêndio em Serviços de
Saúde” não pretende e certamente não conseguiria abordar todas as situações
possíveis, as diversas especificidades, cada uma das variáveis envolvidas ou
ainda os mais diversos riscos inerentes a uma situação de incêndio num EAS.
Nesses casos, espera-se que os projetistas, assim como os administradores dos
EAS apliquem as melhores técnicas disponíveis e o bom senso, buscando preservar
os objetivos de segurança por meio das orientações aqui
apresentadas.
Por fim, importante ressaltar que esse
documento apresenta um apanhado de conceitos relevantes sobre segurança contra
incêndio em Estabelecimentos Assistenciais de Saúde, mas é apenas teórico.
Somente a prática das diversas medidas de segurança contra incêndio como um
sistema único de segurança prepara efetivamente os ocupantes de um EAS para a
resposta adequada em situações de emergência de incêndio.
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1
- Dados divulgados pela SENASP em 2013 na Tabela 43 da Pesquisa Perfil das
Instituições de Segurança Pública, relativa a dados obtidos em 2011, sem
computar as informações dos Estados do Amazonas, Maranhão e Pará.
2
- Registrados 1.051 óbitos pela causa 107 (CID-BR-10) ou exposição à fumaça, ao
fogo e às chamas conforme MS/SVS/DASIS – Sistema de Informações sobre
Mortalidade – SIM, do Departamento de Informática do SUS (DATASUS 2011).
3
- Tomando por base dados do World Fire Statistics Centre (WFSC) em 2012.
4
- Equipamentos elétricos energizados por rede ou fonte de alimentação elétrica,
com finalidade médica, odontológica, laboratorial ou fisioterápica, utilizados
direta ou indiretamente para diagnóstico, tratamento e monitoração em seres
humanos, e ainda os com finalidade de embelezamento e estética.
5 - Conforme definição constante do Decreto Estadual nº 56.819 do Estado de São Paulo, datado de 10/03/2011, é o conjunto de dispositivos ou sistemas a ser instalado nas edificações e áreas de risco, necessário para evitar o surgimento de um incêndio, limitar sua propagação, possibilitar sua extinção e propiciar a proteção à vida, ao meio ambiente e ao patrimônio.
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